quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Liberdade é passar a mão na bunda do guarda.

Recorto e colo o texto do André Forastieri, publicado em 29.09.2008 e republicado em 25.02.2010.

Eu não voto (em 2010)

O texto abaixo foi publicado no dia 29 de setembro de 2008.

De lá para cá, fui obrigado a regularizar minha situação eleitoral, porque meu passaporte venceu. Demorou meia hora da minha vida ir ao Cartório Eleitoral de Pinheiros e acertar tudo.

Estava vazio. A moça era simpática. Paguei R$ 14,04 no Banco do Brasil ali ao lado, rapidinho.

Tenho portanto novo título, que não usarei em 2010.

Como é ano de eleição, boto de novo na roda minha posição sobre eleições. Que é basicamente: não concordo com as regras eleitorais. Portanto, não acredito que votando vou mudá-las. Sou contra a participação nas eleições.

Sou contra o voto nulo, porque é participar do jogo. É impossível o voto consciente, se você não tem consciência de como seu candidato financiou a campanha. Dito isso, as pessoas votam, e outras são eleitas.

E sinceramente às vezes coça minha mão para votar em alguém. Mas resisto.

E não, os políticos não são todos da mesma laia. É estúpida a campanha “não reeleja ninguém”. É estúpido colocar toda a culpa das desgraças do mundo nos políticos.

Eles são financiados por grandes empresas, apoiados por grandes veículos de comunicação e eleitos por você. Todos são responsáveis. Tem político ruim e pior. Escolha o seu, se quiser. Mas não me convide.

Eu não voto

Manhã de domingão de eleição na praia, ressaca do sábado, perfume de filtro solar, fila paralisada. Acabou o formulário para justificar o voto, foram buscar mais em São Sebastião. Quinze minutos, meia hora, quarenta… Quer saber? “Vambora”.

Foi assim que eu parei de votar. Depois dessa, vieram outras eleições. Nunca mais apareci. Não é que me incomodasse muito. Sempre votei relax. Ia a pé ou de metrô, chegava quatro e meia da tarde, tudo vazio, votava sossegado, comia um churro depois.

Mas também nunca mais tive uma boa razão para votar. Nunca mais apareceu uma campanha em que meu voto fizesse diferença, em que, entre os candidatos disponíveis, alguém realmente me convencesse. Picar cartão votando no “menos pior” dá preguiça e é eticamente duvidoso.

Não fui sempre assim, mas também nunca fui muito animado com o processo eleitoral. Nunca fui a um comício pelas Diretas — qualquer campanha que tem como hino Menestrel das Alagoas não pode contar comigo.

Naturalmente eu queria votar e queria ver os milicos de volta aos quartéis, mas estava na cara que as Diretas não iam passar e não passaram, o que nos levou a cinco anos de José Sarney presidente. E, quando finalmente tivemos eleições para presidente, Collor venceu — meio no golpe, mas levou. É de broxar qualquer um.

Fielmente, eu compareci para votar quatro vezes no Lula e petistas diversos. No Covas, uma vez que ele estava pau a pau com o Paulo Maluf. Sempre considerei meus votos como voto útil, porque do contra: sempre votei contra os caras que mais me irritavam, mesmo que eu tivesse discordâncias mil com meu candidato. E não vou negar: tinha minhas esperanças de que, quando o Brasil finalmente tivesse um presidente que não viesse da elite, o jogo finalmente mudaria.

Bem, não… O jogo é quase exatamente o mesmo. Os 5% de diferença fazem diferença e são suficientes para Lula manter a popularidade para mais cinco mandatos. É pouco para me tirar de casa. Então, eu não voto. Porque tenho coisa melhor para fazer no feriadão, porque todos os candidatos com chances de vitória são 95% iguais e porque o voto não é obrigatório. Você leu direito. O voto não é obrigatório.

Se você for pego dirigindo bêbado, perde a carta, talvez o carro, talvez muito mais. Se ficar sem votar, não acontece nada. Se você não votar nem pagar a multa, enfrenta as seguintes penalidades:

a) não pode se inscrever em serviço público;
b) não pode tirar passaporte nem carteira de identidade;
c) não pode renovar matrícula em escolas públicas;
d) não pode obter empréstimos em bancos públicos;
e) não pode participar de concorrência;
f) se o eleitor deixar de votar em três eleições consecutivas, seu título será cancelado.

Bem, estou velho para começar carreira de funcionário público ou finalmente terminar a faculdade de jornalismo, já tenho RG e passaporte. Portanto, as penalidades são quase zero.

E mais: não é um caminho sem volta. Porque se você precisar, digamos, renovar o passaporte, basta pagar a multa. A penalidade para o eleitor que não vota nem justifica é uma multa que varia entre R$ 1,06 e R$ 3,51.

Pode ser multiplicada até dez por um juiz eleitoral — desconfio que nunca aconteça, mas que seja. R$ 35,10 não é muito por um feriadão bem aproveitado. Cada eleição são dois turnos (em boa parte do país, sempre). Você renova o passaporte a cada cinco anos. Faça as contas. Compensa.

Mas na verdade o valor é muito maior do que esse. Porque sabendo de antemão que você não vai votar, você simplesmente se poupa de ler sobre as eleições, assistir aos programas que toquem neste assunto etc. Você se irrita muito menos com a mediocridade e cara de pau dos candidatos (e de seus marqueteiros).

São centenas de horas ganhas a cada ano de eleição que você pode usar de maneira muito mais útil — namorando, ganhando dinheiro, tomando uma com aquele velho amigo. São muitas e muitas horas de alegria nos anos seguintes, em que você não sente a menor necessidade de acompanhar as sem-vergonhices que o cara em quem você teria votado inevitavelmente cometerá.

Já fui contra o voto obrigatório. Não mais. Muito mais prazeroso desrespeitar a lei, sem nenhuma consequência. Igualzinho a um político. Isso é que é liberdade!

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